A Aflição de um Ateu - Edward K. Lankford

Um dos socos no estômago mais comuns que os ateus recebem dos crentes é quando eles dizem que os ateus vão acreditar em Deus quando alguma coisa ruim (por fim) acontecer com eles. "Um dia alguma coisa vai lhe acontecer e você vai ver", vejo-os dizer cheios de pompa.

Entretanto eu acho difícil dar a eles a resposta que você deve estar (digamos, "Nã-nã, é claro que não, não comigo!"). O problema é que eles estão provavelmente certos, embora pelas razões erradas.

O estresse, a depressão, a aflição — estes sentimentos nos fazem sentir mal e num mundo perfeito jamais os experimentaríamos. Não obstante, temos estes sentimentos e a forma com a qual lidamos com eles depende do nosso humor (o qual, por outro lado, depende de nossos sentimentos, criando um círculo vicioso). O sentimento global, entretanto, é o de desamparo — de não estar sob controle. Uma enorme e incontrolável carga de trabalho em nossa ocupação pode causar uma grande quantidade de estresse. De forma similar, aqueles que sofrem de depressão freqüentemente não sabem porque estão deprimidos, e se eles sabem o motivo, geralmente é alguma coisa fora de seu controle. Igualmente, a morte de uma pessoa querida pode facilmente fazer uma pessoa achar que as coisas não estão corretas no mundo porque uma pessoa próxima pode morrer sem aviso.


A falta de ajuda e o fato de ficar sem controle causa a maioria de nossas lutas interiores. "Se tudo fosse simplesmente feito para mim, as coisas seriam muito melhores", dizemos para nós mesmos. Mas e se os eventos em nossas vidas estivessem de fato sob controle, porém não por nós? E se houvesse um deus (ou deuses) que no final das contas controlasse os aspectos do mundo (isso sem mencionar o universo inteiro)? Além disso, e se essas intenções elementares de deus (no estilo Maquiavélico) fossem para o bem de todos?

Embora não seja necessariamente confortante, a idéia de Deus como a decisiva força no mundo pode nos dar um senso de controle: Embora eu não esteja no controle de tudo, Deus está; Deus é bom; então, tudo que acontece é para o bem. Quando nossas vidas estão mais caóticas do que o normal, quando as coisas parecem ruins, precisamos de um pouco de esperança para nos ajudar a permanecer calmos e seguros. A crença em Deus pode nutrir esta esperança: Tudo acontece por uma razão e essa razão é (no final das contas) o bem.

Mais do que qualquer outra coisa, a morte de uma pessoa querida é uma rápida, forte e simultânea fonte de estresse, depressão e sofrimento; entretanto, a maioria (se não todas) das religiões provêem conforto ao dizer que "Deus tem um plano" e (o mais importante) "o fim não é o fim." Mas dizer isso e acreditar nisso é o único jeito de confortar?

Meia hora após sua morte, pedi permissão à minha família bênçãos para fazer um encômio para o vovô. Dei duro pelas palavras certas, as imagens certas para eliciar sobre o vovô. Eu quis mais que qualquer outra coisa acalmar o sentimento de perda em minha família, ajudando-os a aceitar sua morte.

No funeral, quando a segunda música terminou de ser tocada, subi no altar atrás do caixão do meu avô e dei meu melhor para controlar minha voz apenas o suficiente para dizer meu encômio. Voltei para baixo, a música tocou novamente e um pastor seguiu com sua mensagem. Ele leu alguns versos da Bíblia e implorou com aqueles de nós que estava afligido que um dia Jesus voltaria. Quando ele voltar, o pastor disse, ele levará esses que estão na sepultura primeiro, antes desses que estão vivos. "Isso não é uma coisa maravilhosa e confortante?", disse ele com um grande sorriso. Vocês verão o vovô novamente, disse ele, contanto que vocês acreditem.

Havia algo fundamentalmente diferente entre meu discurso e a mensagem do pastor que não atentei até um ou dois dias depois. Quando eu estava falando sobre a morte do meu avô, minha mensagem dizia "Sim, E", porém a mensagem do pastor dizia "Sim, Mas". Permita-me explicar.

Por um lado, no encômio que fiz, eu quis que minha família aceitasse a morte do meu avô e chamar a atenção para nossas lembranças dele como uma fonte de conforto. Por outro lado, o pregador queria que eles fossem pacientes e não aceitassem sua morte como a palavra final. Eu disse, "Sim, vovô está morto, e aceitemos o fato de que nós nunca o veremos novamente e vamos apreciar as lembranças que temos de sua vida." O pastor dizia, "Sim, ele está morto, mas ele viverá novamente e será imortal."

Então, o que é mais confortante? Aceitar a morte como o ponto final da vida ou negar a finiture da morte e acreditar que esta é uma transição para uma vida perpétua?

Essa é uma pergunta injusta, para dizer a verdade. Tudo depende do tipo de pessoa que você é. Certamente a maioria das pessoas no mundo são religiosas e encontrariam seu conforto na segunda opção. Não obstante, elas também ficam tipicamente confusas ou chocadas com o fato de alguém poder pensar de outra forma, e acreditam que a forma delas é o único meio de se aceitar a morte. É por isso que elas apresentam um grande sorriso quando dizem "Um dia alguma coisa vai acontecer e você vai ver." Os crédulos são tão convictos que estão certos (eles têm que estar) que eles são forçados a concluir que um dia os incrédulos irão chegar a essa conclusão também.

Ainda assim a falta de imaginação por parte do crédulo de nenhuma forma proíbe os ateus de acharem conforto para suas aflições ao aceitarem o aspecto conclusivo da morte. Na minha opinião acho que os crédulos vivem em constante negação da morte por construírem uma visão de mundo onde a morte é um ponto de transição para uma vida onde a morte não existe. A negação é um dos primeiros passos para aceitar a morte de alguém mas isso posteriormente conduz à aceitação; entretanto, quando o assunto é a morte em si, a maioria das religiões age como um pilar da negação.

Mas estou sendo muito severo. Mesmo se não existisse algo como a religião, a negação da morte ainda ocorreria. Eventos traumáticos em nossas vidas podem nos fazer reagir de várias formas irracionais (porém muito humanas). A negação vem de dentro e, enquanto a religião fornece uma legitimidade para negar a morte, ainda somos nós que decidiremos como lidamos com a morte.

A morte carrega questões sobre o significado e o propósito da vida. A irmã de um de meus amigos cristãos uma vez me confrontou sobre a morte. "Se você morrer e isto é fim, então por que fazer qualquer coisa na vida?" ela me perguntou sarcasticamente. "Para que ir à faculdade e conseguir uma graduação? Para que realizar alguma coisa se isso não vai nunca vai ter importância?"

Respondi: "Mas isso tem importância — Me importa o que faço na minha vida." Freqüentemente as pessoas pensam que a finitude da morte torna a vida sem sentido. Não poderia ser mais errado, pois são a brevidade e a fragilidade da vida que nos dão o incentivo e o propósito de fazer a vida significar alguma coisa. Se não existisse a morte nossas vidas tenderiam para a preguiça e o seu sentido se tornaria vazio.

"Quero falar com você, vovó," disse eu para a matriarca da minha família no dia do funeral do meu avô. Vovó foi empurrando seu aparelho que a ajuda caminhar até o outro lado da casa, para o quarto onde seu marido ocupou nos últimos meses de sua vida. Fechei a porta e sentei próximo a ela na cama. Sendo meio surda, minha avó só ouviu parte do meu discurso no funeral.

"Nunca irei ler isso em voz em alta novamente, mas vou ler para você agora, para você poder ouvir", eu disse. Ela me segurou com força e me ouviu atentamente. Quando u terminei, seus olhos tristes me olharam e ela me disse: "Nem sei quantas vezes escutei da nossa família que, após seu discurso fúnebre, não precisávamos de um pastor. Vovô teria adorado isso."

Não consigo pensar em qualquer coisa na minha vida que tenha me deixado mais orgulhoso. Isso pode ser feito. O conforto não tem que vir da recusa em aceitar a morte como o fim. Descobri que o sofrimento e a aflição são expressões de amor e nós não precisamos de uma crença em quaisquer deuses para amarmos uns aos outros.

Traduzido por:
Rogério Augusto Pereira Silva

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